Relatos Selvagens (2014)

•janeiro 23, 2015 • 3 Comments

Título original: Relatos salvajes

Origem: Argentina / Espanha

Direção: Damián Szifrón

Roteiro: Damián Szifrón

Com: Ricardo Darín, Leonardo Sbaraglia, Camila Franco, Diego Gentile, María Marull

Tenho visto, ultimamente, nas redes sociais comentários super positivos e bem entusiasmados sobre Relatos Selvagens, filme argentino produzido pelos irmãos Almodóvar, escrito e dirigido por Damián Szifrón, indicado à Palma de Ouro em Cannes em 2014 e, agora, concorrendo ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

relatos salvajes

Entendo o entusiasmo, já que o filme é de fato 1) interessante 2) argentino e 3) “politicamente incorreto” (talvez não seja este o termo mais apropriado). Sendo esses dois últimos itens coisas da moda nesta nossa sociedade do espetáculo. Explico-me:

Curiosamente, em solo brasileiro, “ser argentino” pesa a favor do filme (afinal, não estamos falando de futebol!). Na verdade, já faz alguns anos que os filmes argentinos tornaram-se queridinhos dos brasileiros. Fato, aliás, perfeitamente compreensível, se considerarmos a excelente qualidade do que vem sendo produzido por nossos hermanos. No entanto, falar que filme argentino é muito bom acabou virando uma espécie de clichê para os cinéfilos de plantão, ou para os “entendidos” de arte em geral. Vamos com calma aí. Em qualquer país, há filmes e filmes.

Um outro ponto que pesa a favor de Relatos Selvagens, ajudando-o a entrar na listinha dos queridinhos do público e da crítica, é seu lado “politicamente incorreto”, ou talvez, mais precisamente, seu lado “macabro”, violento, rebelde, e que atrai muito mais hoje em dia. Isso porque depois de tanto se incutir na cabeça das pessoas a ideia de que tudo (exagero aqui!) que antes era visto como normal era, na verdade, politicamente incorreto, hoje, o que se vê, ao contrário, é uma total desvalorização do seguimento às regras e do bom comportamento. O bacana agora é ser “do mal” (mais um exagero!). O politicamente correto não só perdeu a graça, como perdeu seu lugar ao sol. O que se vende hoje como “legal” ou “cool” é quebrar regras, ser do contra, não respeitar às leis. Como se fazer as coisas certas e seguir regras fosse um mal. Talvez esteja na hora de encontrarmos um equilíbrio! Assim sendo, como reflexo deste período de extremos, filmes sobre bons sentimentos, com personagens de boa índole, não são mais tão valorizados. Entram na vala dos água-com-açúcar e perdem pontos com os “entendidos”. Mas isto é assunto para uma tese…

Não estou querendo dizer aqui que Relatos Selvagens seja ruim. De forma alguma. Achei o filme bom, bem feito e interessante. Os sketches escolhidos formam um todo coerente, tendo como fio condutor aquela raiva que vai se avolumando dentro do cidadão comum diante das injustiças do dia-a-dia e de sua impotência e incapacidade para vence-las. Todas as partes são filmadas de forma simples, objetiva, direta, vez por outra com planos tomados de ângulos bastante inusitados e acompanhadas de boa trilha musical. Sem falar no sketch de abertura – muito bom, à la Almodóvar – que me fez criar ainda mais expectativas com relação ao filme.

No entanto, tenho que dizer aqui que esperava bem mais de Relatos Selvagens. Não achei assim “nenhuma Brastemp”, principalmente, porque não achei original. Não é original nem na forma (composto por sketches), nem no conteúdo. Lembrei o tempo todo de Um dia de fúria (1993), excelente filme realizado por Joel Schumacher, com Michael Douglas e que trata justamente desta explosão de raiva contida, desse sentimento de vingança que ultrapassa o limite do aceitável e do racional e que leva a pessoa ao fundo do poço, a um caminho muitas vezes sem volta, difícil e amargo. O tempo todo, ao longo do filme, vinha-me à mente a imagem de Michael Douglas enfurecido, “vomitando” seus piores sentimentos e assustando a todos a sua volta, um personagem que é ao mesmo tempo vítima e algoz de uma sociedade injusta e hipócrita. Como se Damián Szifrón tivesse “repaginado” aquele filme, dividindo-o em partes, adaptando-o à realidade argentina e às diferentes situações da vida naquele país.

Para os que adoraram o filme, peço que me desculpem. Talvez eu tenha caído exatamente no “conto do filme argentino” que mencionei no início deste texto, criando, por isso, expectativas demasiadamente elevadas com relação a Relatos Selvagens. Sem falar nesta mania de cobrar originalidade de tudo e de todos. Mea culpa. Afinal, quem disse que tem que ser original para ser bom?

Um filme PRA SE ANGUSTIAR.

PS. Ainda não entendi o porquê de alguns críticos colocarem o filme na categoria “comédia”. Só se for humor negro, pois o filme é bem angustiante, tratando sempre de sentimentos ruins, em situações deprimentes, violentas e pesadas. Não consegui dar nenhuma risada.

 

 

The Giver, Hunger Games & The Hobbit

•janeiro 15, 2015 • Leave a Comment

Nessas férias de fim de ano – que infelizmente acabaram segunda passada – deixei de lado os meus filmes-objetos-de-estudo (brasileiros dos anos 60) e entreguei-me de peito aberto aos blockbusters voltados para os “young adults” como dizem os americanos.

Reabro assim os trabalhos com uma breve análise de alguns dos filmes assistidos com meus filhos adolescentes.

The-Giver-Film-Adaptation-2014

O Doador de Memórias (2014)

Título original: The Giver

Origem: EUA

Direção: Philip Noyce

Roteiro: Michael Mitnick, Robert B. Weide, Lois Lowry (autora do livro)

Com: Meryl Streep, Jeff Bridges, Brenton Thwaites, Odeya Rush, Kate Holmes

O filme é muito curto, deixando-nos com a impressão de que faltou alguma coisa. A história, baseada no best-seller de mesmo título, publicado em 1993, é pouco original, com partes um tanto quanto inverossímeis, porém interessante, sobretudo se considerarmos que o livro virou uma espécie de introdução ao gênero das “distopias”. Pelo menos nas escolas americanas, onde tornou-se um must-read da Middle School (o que equivale ao nosso ex-ginásio – fui longe! – ou mais modernamente, ensino fundamental, do quinto ao oitavo ano).

O trabalho de cores, tanto no filme quanto na história em si, é bem bacana, mas não surpreende hoje em dia por sua originalidade. Assim, apesar de reunir nomes de peso como Meryl Streep e Jeff Bridges (ele é, inclusive, o produtor), o filme não impressiona. Uma pena! Meus filhos gostaram bastante de ler o livro e disseram que o filme não conseguiu envolve-los da mesma maneira.

 hobbit-3-posterO Hobbit : A Batalha dos Cinco Exércitos (2014)

Título original: The Hobbit – The Battle of the Five Armies

Origem: Nova Zelândia / EUA

Direção: Peter Jackson

Roteiro: Fran Walsh, Philippa Boyens, Peter Jackson, Guillermo Del Toro, J. R. R. Tolkien

Com: Ian McKellen, Martin Freeman, Richard Armitage, Evangeline Lilly, Christopher Lee, Cate Blanchett, Orlando Bloom

Muito barulho, muita informação e muita, mas muita mentira! Tudo bem. Eu sei que quando vamos assistir a um filme fantástico, temos que estar prontos para aceitar as fantasias, as inverossimilhanças, enfim, as mentiradas todas que fazem o filme pertencer à categoria dos “fantásticos”. Senão, melhor nem assistir. No entanto, desta vez, Peter Jackson se superou. Algumas cenas da batalha dos cinco exércitos são absurdamente mentirosas, ao ponto de provocar risos da plateia adolescente que curte o mundo fantástico de J. R. R. Tolkien. Confesso que gosto de filmes fantásticos, mas este último episódio de Hobbit me decepcionou um pouco. Efeitos especiais excessivos, barulho demais, ação demais. Tudo demais. Tanto que a sempre excelente banda sonora, mais uma vez a cargo de Howard Shore, acabou ficando meio apagada. O filme, na verdade, me cansou e acabei ficando feliz de ver a saga de Bilbo Baggins chegar ao fim. Infelizmente não li os livros. Meu filho, que os leu, disse que são excelentes. E não duvido, pois lendo sobre a vida de seu autor, fiquei fascinada pela originalidade e genialidade de Tolkiens. Só de pensar que ele criou alfabetos completos, que podem ser aprendidos e falados por qualquer um de nós (ou não), é de se tirar o chapéu. Interessante também saber que mesmo tendo vendido os direitos para realização dos filmes antes de sua morte, Tolkiens nunca acreditou na possibilidade de transpor com precisão para a telona o universo que ele concebeu tão detalhadamente em seus livros (ele levou mais de dez anos para escrever O Senhor dos Anéis). Talvez ele tivesse razão. Ou talvez não, já que as trilogias Senhor dos Anéis e Hobbit são sempre um grande sucesso de bilheteria, podendo-se até afirmar que já conta com pelo menos duas gerações de fãs.

 Hunger Games 3Jogos Vorazes: A Esperança – Parte 1 (2014)

Título original: The Hunger Games: Mockingjay – Part 1

Origem: EUA

Direção: Francis Lawrence

Roteiro: Peter Craig, Danny Strong, Suzanne Collins (autora do livro)

Com: Jennifer Lawrence, Josh Hutcherson, Liam Hemsworth, Philip Seymour Hoffman, Julianne Moore, Woody Harrelson

Mesmo não gostando dessa mania que se tem hoje de dividir filmes (livros) em duas partes, meu destaque vai, então, para Jogos Vorazes: A Esperança – Parte 1. Talvez essa escolha se dê pelo fraco que tenho por histórias de mundos distópicos, pós apocalípticos, futurísticos… (mas já falei isso antes !). Na verdade, desde os Jetsons de minha infância até o dia em que li, na minha adolescência, o livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, venho encantando-me mais e mais com essa possibilidade “profética” que a ficção nos oferece.

Jogos Vorazes: A Esperança baseado na primeira parte do terceiro livro da trilogia Jogos Vorazes – vem desta vez com um viés bem mais intimista, mais introspectivo. Nada de arena, de batalhas artificialmente impostas, de tributos, de mentores e de todas aquelas cores e contrastes entre a capital e os distritos. Desta vez, as cores e os exageros dos dois primeiros filmes (livros) são deixados de lado, e o cinza, o marrom e os tons escuros predominam na tela. O filme é bem mais sombrio e denso, apesar da menor quantidade de cenas de morte. Acontece que como a guerra agora é real (e não mais um “jogo”), os ataques à população inocente são pra valer. A coisa fica então ainda mais pesada e, ao mesmo tempo, mais interessante. É como se de repente saíssemos do gênero fantástico para o gênero de guerra. E Jennifer Lawrence tem aí bastante espaço e tempo para mostrar do que é capaz. E é ela que conduz o filme, estando presente na maior parte das cenas. Com uma bela atuação, mostra-se frágil, vulnerável, abalada, confusa, mas, ao mesmo tempo, ainda capaz de reagir às injustiças. Uma alma visivelmente marcada de guerra, traumatizada, ferida, como qualquer personagem saído de uma guerra verdadeira, que teme, mas que carrega dentro de si o horror à injustiça e à violência, não enxergando, porém, outra maneira de lutar se não revidando, reagindo.

Falando em guerra, é interessante notar o uso da propaganda neste filme. Aqui ela é usada como poderoso instrumento de guerra, uma verdadeira arma de combate. De um lado, a Capital usa Peeta (Josh Hutcherson) para chantagear os Distritos (via Katniss); de outro, os Distritos usam Katniss (Jennifer Lawrence) para ameaçar a Capital. Via imagens televisivas estabelece-se, sobretudo, uma guerra psicológica que atinge em cheio o alvo. Interessante também ver a equipe de filmagem do Distrito 13 em cena, filmando ao vivo, no local de guerra, não deixando escapar nenhuma ação nem reação daquela que é o símbolo da rebelião: o Mockingjay. Tudo isso embalado por um trilha linda, com músicas da cantora Lorde (neozelandesa de sucesso no mundo pop), Stromae (jovem belga que faz grande sucesso no mundo francófono) e com direito até a uma música cantada pela própria Jennifer Lawrence e que vira o hino da rebelião: The Hanging Tree. E para concluir, há ainda a participação já saudosa de Philip Seymor Hoffman.

Para quem gosta de filmes sobre mundos distópicos, o filme é muito bom! Já estou louca para ver o próximo e último!

É isso. Feliz Ano Novo e Bons Filmes!

 

Magia ao Luar (2014)

•dezembro 19, 2014 • 1 Comment

Título original: Magic in the Moonlight

Origem: EUA

Diretor: Woody Allen

Roteiro: Woody Allen

Com: Colin Firth, Emma Stone, Marcia Gay Harden, Simon McBurney

Depois de um bom tempo afastada dos filmes e das críticas, sem poder ir ao cinema em função do doutorado, volto a escrever hoje para fechar o ano de 2014.

O filme escolhido para esse encerramento é divertido, leve e mágico, como este período do ano. Um feel-good moviMagic-in-the-Moonlight-07jul2014-1e que nos enche de esperança, de paz, de alegria e, sobretudo, de fé na nossa capacidade (e possibilidade) de ser feliz.

O mais curioso desta história é que o autor do filme em questão é ninguém mais, ninguém menos do que Woody Allen. Diretor nova-iorquino conhecido por sua obra “intelectualizada”, excessivamente auto-reflexiva e, por isso mesmo, muitas vezes considerada chata por grande parte do público. Mas que, ao mesmo tempo, foi e é responsável pela formação de uma grande legião de fãs, que amam cada linha escrita (e muitas vezes interpretada) pelo mestre. Não sei se esse grupo anda muito satisfeito com o ídolo…

O fato é que seus últimos filmes (Meia-noite em Paris (2011), Para Roma com Amor (2012) e o excelente Blue Jasmine (2013), o mais complexo dos três ) têm sido cada vez mais descomplicados, leves e fáceis de entender, e nem por isso menos interessantes. Como se a idade estivesse lhe dando mais liberdade para ser menos racional, menos “intelectual”, podendo até mesmo se dar ao luxo de realizar filmes “água-com-açúcar”. A impressão que se tem é que, do alto de seus setenta e muitos anos, Woody Allen descobriu enfim que a vida pode ser mais simples, mais colorida e mais divertida do que ele sempre acreditou.

Assim, cedendo amplo espaço à magia, à fantasia e ao irracional, Woody Allen volta às telonas com Magia ao Luar. Um filme que trata exatamente de tudo isso que acabei de falar. Uma obra auto-reflexiva, em que seu autor coloca em imagens e sons (a trilha é deliciosa) sua nova maneira de enxergar o mundo.

O filme se passa no fim dos anos 20 na Europa e conta a história de Stanley (Colin Firth) , um mágico que se apresenta sob o codinome de Wei Ling Soo, e que é convocado por um amigo e colega de profissão, Howard (Simon McBurney, com  visual e gestual muito semelhantes aos do próprio Woody Allen) para desmascarar Sophie (Emma Stone), uma suposta impostora que se diz médium. A doce e encantadora americana de classe média que com seus poderes sobrenaturais e sua beleza consegue seduzir o herdeiro de uma importante e rica família de empresários do sul da França.

Acontece que o extremamente racional e antipático Stanley também será seduzido pelos poderes de Sophie e verá, subitamente, toda sua maneira de enxergar a vida ser questionada.

A narração é linear e simples, sem recorrer a flashbacks, flashforwards ou nada que atrapalhe o bom entendimento da história. A fotografia é bonita, os cenários também, figurino lindo, mas tudo com um quê de artificialidade e de um pouco “forçação” de barra. Os personagens são caricatos e previsíveis, assim como o próprio enredo do filme. Como se tudo fosse propositalmente feito para entendermos desde o começo que se trata de uma história mágica, espécie de alegoria, ou de um romance cor de rosa, daqueles saídos diretamente dos livros de M. Delly.

Ainda que açucarado e cor de rosa, o filme vale a pena. Woody Allen termina por confirmar sua visão mais racional da vida, deixando, no entanto, a mensagem de que acreditar no “invisível” também tem seu valor. É um filme gostoso de ver, daqueles que nos fazem sair do cinema com uma sensação de que a vida vale a pena e que – parafraseando Gonzaguinha – não é preciso ter vergonha de ser feliz!

Feliz Natal a todos! Boas festas e bons filmes!

Samba (2014)

•outubro 21, 2014 • Leave a Comment

Título original: Samba

Origem: França

Direção: Eric Toledano, Olivier Nakache

Roteiro: Eric Toledano, Olivier Nakache, Delphine Coulin (livro)

Com: Omar Sy, Charlotte Gainsbourg, Tahar Rahim, Izïa Higelin Samba-avec-Omar-Sy

Uma comédia romântica, dramática e social, que aborda com leveza e seriedade um tema totalmente da atualidade: a situação dos imigrantes ilegais na França – os “sans papiers” –, numa situação “aplicável” certamente para todo o continente europeu.

O duo Eric Toledano e Olivier Nakache, responsável pelo estrondoso sucesso de 2011, Intocáveis, volta à cena em 2014, estrelando o mesmíssimo e carismático Omar Sy em mais uma crônica da sociedade francesa atual. Porém, sem o mesmo encanto do filme anterior.

Num tom talvez um pouco menos alegre do que o de Intocáveis, apesar da música (brasileira) tocada em alto volume mais de uma vez no filme, a dupla conseguiu tratar novamente de um tema sério e complexo de maneira leve e sem pieguices, porém um pouco estereotipada demais para o meu gosto, com ares de contos de fada. Os personagens são em sua essência todos bom caráter, charmosos, simpáticos, alguns meio malandros, outros mais ingênuos, mas em sua maioria, gente do bem.

A história vai girar, então, em torno de Samba (Omar Sy), um senegalês residente na França há dez anos, mas que ainda luta para conseguir sua “carte de séjour”, documento que lhe garantiria uma residência legal no país. Vive de bicos, trabalhando em pequenas empresas que contratam ilegais por salários de miséria, fazendo vista grossa à ausência de documentos. Praticamente tudo que ganha, manda para sua mãe no Senegal, levando assim uma vida bem franciscana. Acontece que, de vez em quando, a fiscalização bate nos estabelecimentos suspeitos e leva presos alguns dos ilegais. E é assim justamente que começa o filme.

Samba vai ser detido e, em seguida, julgado. No entanto, na prisão, os ilegais contam com o apoio de um grupo de voluntários que tentam defende-los. E é lá que ele vai conhecer Alice (Charlotte Gainsbourg, atriz queridinha da França, sempre com aquela cara de deprimida, sem um pingo de cor!), uma ex-workaholic, que pilota um lindo Mini pelas ruas de Paris, e que se recupera de uma crise depressiva (burn out) em função do excesso de trabalho.

Os dois vêm, portanto, de classes bem diferentes, com culturas diferentes e têm situações de vida muito distintas: ela, sofrendo pelo excesso de trabalho; ele, pela falta de trabalho. No entanto, os dois compartilham medos, solidões, anseios e uma vontade grande de mudar sua condição de vida. Desnecessário dizer o que vai acontecer, né?

Apesar de seu roteiro mais ou menos e de sua mise en scène sem novidades, Samba tem o mérito de trazer à tona um tema muito sério e totalmente da hora que merece ser exibido para ser, assim, assumido e discutido. O filme mostra uma França-torre-de-babel, com muitas raças e línguas diferentes tentando se entender e sobreviver. Não há emprego para todos. Mas tampouco há emprego para esses imigrantes em seus países de origem. Esse povo não vem para a França para ver a torre Eiffel nem para aprender francês in loco. Eles vêm por pura falta de escolha, já que a situação lá é muito pior. Deixam suas famílias, seus amigos, suas raízes e suas tradições para trás. São obrigados a assimilarem rapidamente novos costumes e hábitos. Muitas vezes são perseguidos, humilhados. Mas ainda assim, acham que vale a pena o sacrifício, pois o pouco que ganham aqui ainda é muito em suas terras de origem. Em solo europeu, não são gente, não têm documentos, não existem. Fazem, no entanto, um serviço que muitos europeus não querem fazer. E os governos, enquanto lhes convém, fingem que não os estão vendo. Na hora em que são pressionados, quer seja pela população – que também sofre com a crise financeira e com a consequente falta de emprego -, quer seja por alguém de oposição, reclamando sobre sua incompetência administrativa, fazem, então, uma “limpeza”, devolvendo alguns ilegais de volta para casa. Um “paliativo” infelizmente bem comum por estas bandas!

Samba fica assim entre filme realista e conto de fadas, sem o encanto de Intocáveis, deixando aquele gostinho de que o duo Toledano-Nakache poderia ter ido além…

Um filme PRA SE DISTRAIR.

PS. Interessante (?) a imagem dos brasileiros na França… a discutir!

 

Garota Exemplar (2014)

•outubro 12, 2014 • 4 Comments

Título original: Gone Girl

Origem: EUA

Direção: David Fincher

Roteiro: Gillian Flynn

Com: Ben Affleck, Rosamund Pike, Neil Patrick Harris, Tyler Perry, Carrie Coon

gone girl

Um filme de suspense, hiperbólico, meio “forçação de barra”… mas que, com bastante ironia, faz uma bela crítica à sociedade do espetáculo em que vivemos, amarrados que estamos a tantos reality-shows, facebooks, instagrams, tweeters e demais forjadores de realidades e propagadores de informação à velocidade da luz.

Adaptado do livro de mesmo título, escrito por Gillian Flynn e publicado em 2012, o filme conta a história de um casal que celebra (ou deveria celebrar) seus cinco anos de casamento, refletindo aí sobre os votos que fizeram, o caminho que percorreram e as mudanças de comportamento, de sonhos e de expectativas que se lhes deparam no presente.

Mas nesse exato dia, Amy (Rosamund Pike), “a esposa”, desaparece em situação meio suspeita. Assim como suspeita é também a reação do marido, Nick (Ben Affleck), que do alto de sua aparente indiferença e descontentamento, resolve, desde a primeira hora do suposto desaparecimento, chamar a polícia e fazer um grande “auê” sobre o fato, espalhando cartazes, convocando a imprensa, criando um comitê para procurar a esposa desaparecida. Aliás, uma excelente crítica aos exageros e sensacionalismos tantas vezes vistos na terra do Tio Sam, berço da sociedade do espetáculo, experts em produzir fatos e eventos (logo vemos toda a cidade com bottons, camisetas, cartazes, etc).

O filme vai, então, nos conduzir por um labirinto de informações fornecidas, ora pela voz off de Amy em flashback, escrevendo em seu diário, e contando-nos, pouco a pouco, a vida dos dois pombinhos, desde quando se conheceram até o desmoronar do relacionamento. Ora pelos fatos que vão desfilando diante de nossos olhos, via o dia-a-dia de um Nick indiferente, marido infeliz, infiel, e muito, muito suspeito. Tão suspeito que nos faz desconfiar de tudo.

E é justamente aí que está a graça do filme. Tudo é muito suspeito, já que tão bem armado. E o vai-e-vem no tempo, joga com nossa mente, fazendo-nos mudar de ideia a cada nova informação. Quem é o verdadeiro vilão? Existe “um” vilão nesta história? O que é armação e o que é realidade?

Para contribuir com todo esse clima de simulacro – e para confundir ainda mais nossas cabeças -, há o nada desprezível fato de Amy ser também a personagem principal de uma série de livros infantis, criada por seus pais quando de sua infância. “Amazing Amy” é uma personagem encantadora, corajosa, linda, feliz, perfeita. Fruto de uma infância e adolescência pintadas com cores de arco-íris pelos pais da Amy de carne e osso. Uma vida inventada, idealizada e distante da realidade vivida pela jovem. Espécie de avatar da verdadeira Amy.

Diretor dos excelentes Seven (1995), O Curioso Caso de Benjamin Button (2008), A Rede Social (2010) e de Millenium: Os homens que não amavam as mulheres (2012), entre outros, David Fincher sabe o que faz, e já está habituado a manipular nossa mente e nossas emoções.

Garota exemplar não tem o impacto de Seven, nem a originalidade de Benjamin Button, tampouco os requintes de crueldade de Millenium. É uma obra hiperbólica, meio forçada, a meio caminho entre o real e o forjado. Mas, além de condensar a experiência acumulada ao longo de todos esses anos de trabalho (filmes) de Fincher, surpreende ao fazer-nos refletir sobre até que ponto o modo como vivemos é de fato reflexo de quem somos ou apenas uma idealização do que gostaríamos de ser.

Talvez um pouco mais longo do que deveria, Garota exemplar é, no entanto, sem dúvida, um bom divertimento, além de, uma ótima sátira de nossa triste sociedade do espetáculo.

Um filme PRA SE DISTRAIR e PRA PENSAR.

 

A 100 Passos de um Sonho (2014)

•outubro 3, 2014 • Leave a Comment

Título original: The Hundred-Foot Journey

Origem: Índia / EUA / Emirados Árabes

Direção: Lasse Hallström

Roteiro: Steven Knight, Richard C. Morais

Com: Helen Mirren, Om Puri, Manish Dayal, Charlotte Le Bon

Esqueçamos os filmes-cabeças, com todos os seus intelectualismos ou suas inovações cinematográficas (quer de roteiro, de técnica ou de forma narrativa), filmes que têm por objetivo sacodirem os espectadores de suas inércias mentais, fazendo-nos enxergar a realidade… Nada disso!

A 100 Passos de um Sonho é filme-passatempo, leve, divertido, “fofo”, uma espécie de conto de fadas multicultural, ou simplesmente, um feel-good movie como gostam de dizer os americanos.

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Coproduzido por ninguém mais, ninguém menos que Steven Spielberg e Oprah Winfrey, o filme é muito gostoso de se ver, apesar de sua história repleta de clichês, déjà-vus e desdobramentos pra lá de previsíveis. Sem falar que, como boa clássica produção hollywoodiana que é, o filme é cheio de improbabilidades, de acontecimentos inverossímeis e de absurdos que forçam um pouco a barra. Tudo para contar uma bela história.

O enredo é, na verdade, bem simples: uma família de indianos – os Kadam -, donos de restaurante, após terem perdido tudo em um incêndio criminoso em Mumbai, resolvem imigrar para a Inglaterra. Porém, ao chegarem lá, descobrem que falta sabor aos alimentos da ilha e resolvem, então, partir para o continente em busca do sabor verdadeiro. Dentro de uma van caindo aos pedaços (clichê), dirigem meio sem rumo pelas estradas europeias até que, “por obra do destino”, perdem os freios e acabam tendo que pernoitar em uma cidadezinha do sul da França, local em que redescobrem o sabor dos alimentos. Bingo!

Papa Kadam (Om Puri) resolve então que é ali, na terra de uma das gastronomias mais sofisticadas do planeta, com todos os seus Condon Bleu, estrelas Michelin e Ratatouille, que vão fixar residência e abrir seu restaurante. Compram e reformam em poucos dias (really?) um restaurante abandonado e montam ali seu colorido e barulhento Maison Mumbai. O único problema é a localização do imóvel: exatamente na frente do melhor restaurante do vilarejo, estabelecimento já consagrado com uma estrela Michelin e comandado pela terrível viúva Madame Mallory (Helen Mirren). O grande trunfo de Papa Kadam para enfrentar a atroz concorrência é seu filho Hassan (Manish Dayal), que herdou os dons culinários da mãe, morta no incêndio em Mumbai.

A partir daí fica fácil imaginar o resto. Guerra gastronômica, guerra cultural e guerra étnica, tudo isso, claro, com boas pitadas de romance. Por falar nessa guerra, é ela a responsável por uma das sequências mais interessantes do filme, composta por planos bem curtos, cortes secos, em montagem paralela, mostrando os dois campos de batalha: o restaurante francês de um lado e o indiano do outro. Os planos são acompanhados pelas respectivas músicas de cada país e ritmados pelos cortes dos alimentos. Ou seja, é o barulho das facas cortando legumes e carnes, em uma velocidade alucinante, que dá o ritmo desta batalha. Bem interessante!

Há também um plano-sequência com um belo movimento de câmera, em que ela segue os personagens, ziguezagueando pelo bucólico cenário do interior da França, (acho que) na hora da reforma do restaurante indiano. Aliás, apesar de toda a “fraqueza” do cenário, há que se dizer aqui que a fotografia do filme é muito bonita, predominando os tons alaranjados, presentes tanto nos temperos indianos como nos lindíssimos entardeceres franceses.

Sem querer diminuir a Pixar – eu adoro os filmes da Pixar! – e sem querer tampouco desprezar a produção do mestre Spielberg, tenho a impressão de que este roteiro caberia perfeitamente em um filme de animação do estúdio californiano, hoje, parte do grupo Disney. Inclusive há várias cenas no filme de Lasse Hallström que, ao meu ver, fazem alusões ao fofíssimo Ratatouille (2007), tais como a sequência do omelete, primeiro na hora de sua preparação, com Hassan comandando a receita, mas sem poder usar suas próprias mãos para faze-la, depois na hora da degustação em que a câmera se aproxima de Madame Mallory; ou então a do chef Hassan em Paris, observando a cidade-luz do topo do prédio, assim como fazia o ratinho chef Remy, cheio de nostalgia, com saudades de sua família, de seu mundo e de suas raízes. Sem falar numa questão fundamental em ambos os filmes, que é a do poder que tem a comida de transportar-nos de volta para casa. Há, inclusive, uma fala já no fim do filme que diz: “Every byte takes you home!” E não foi isso que aconteceu com o crítico-vilão em Ratatouille, por sua vez, uma linda homenagem às famosas madeleines de Proust?

A 100 Passos de um Sonho talvez seja um filme “artisticamente” fraquinho, mas absolutamente delicioso de se ver! Pena que o cinema ainda não adicionou o cheiro às suas infinitas dimensões…

PRA SE DISTRAIR.

 

3 Cœurs (2014)

•setembro 28, 2014 • Leave a Comment

Título original : 3 Cœurs

Origem : França / Alemanha / Bélgica

Direção : Benoît Jacquot

Roteiro : Benoît Jacquot, Julien Boivent

Com: Catherine Deneuve, Chiara Mastroianni, Charlotte Gainsbourg, Benoît Poelvoorde

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O título do filme já dá bons indícios de seu enredo: um homem, duas mulheres, 3 corações. No entanto, o que ele não deixa claro é que poderia também se intitular “4 corações”, já que o nosso, enquanto espectador, também participa ativamente dessa história, sofrendo, torcendo, se angustiando, se espantando, não compreendendo… tentando encontrar uma solução.

O filme conta a história de um homem maduro, Marc Beaulieu (Benoît Poelvoorde), um servidor público, fiscal da receita federal, que, em uma viagem de trabalho, perde o trem de volta a Paris e se vê obrigado a passar uma noite numa cidadezinha qualquer da Provence. Lá ele conhece e se apaixona por Sylvie (Charlotte Gainsbourg), uma moça enigmática que erra pelas ruas da cidade, meio perdida, meio angustiada, em busca de algo que não sabe bem o quê. Os dois passam a noite juntos andando pela cidade até a hora em que Marc pega o trem de volta para Paris. Marcam então um encontro na cidade-luz, para dali a alguns dias, no Jardim das Tulherias, mas não trocam número de telefones nem endereços de email. Na verdade, não sabem nem mesmo seus nomes completos. Fica tudo no sonho, no romantismo e na palavra dada!

Ela vai ao encontro marcado e espera por um bom tempo. Um lindo sol de outono lhe faz companhia. Marc fica preso com uns clientes chineses no trabalho, e sofre, em seguida, um mal estar (um princípio de infarto), chegando muito atrasado ao encontro e perdendo a chance de iniciar ali um belo romance.

Arrasada pelo ex-futuro relacionamento promissor, Sylvie resolve largar a mãe (Catherine Deneuve) e a irmã Sophie (Chiara Mastroianni) e seguir seu namorado (sim, ela tem um companheiro) em um novo trabalho nos Estados Unidos.

Sophie, que também é sua sócia em um Antiquário, sofre enormemente com a separação. É a primeira vez que as irmãs se separam.

Enquanto isso, Marc, na tentativa de reencontrar Sylvie, volta à Provence, alegando precisar rever os clientes que lá encontrou. E eis que o destino lhe prega uma peça: ele vai conhecer e se apaixonar por Sophie, que chega até a Receita Federal pedindo ajuda com a contabilidade de seu Antiquário, sem desconfiar que ela é a irmã de sua amada desaparecida. O circo está então armado.

Todos os elementos para um bom melodrama estão aí reunidos. Porém, Benoît Jacquot, decide navegar por outras águas, e, ao invés de um melodrama adocicado, apresenta-nos uma espécie de thriller romântico com personagens que fogem ao esquema maniqueísta de bonzinhos e vilões. Ninguém é de todo bom nem de todo mau. As coisas acontecem simplesmente por acontecerem. Alguns podendo atribuir-lhes a origem ao destino, ao azar, à sorte… ou ao livre arbítrio.

3 Coeurs é construído em formato de suspense. A excelente trilha, assinada por Bruno Colais, desde suas primeiras cenas dá o tom do filme, tendo papel fundamental na trama. Alguns ruídos (sons ambientes) chegam mesmo a ser super valorizados, interferindo também na história. Sem falar em objetos que servirão de pistas para desvendar o mistério e que também estão em cena.

Panorâmicas rápidas, movimentos bruscos de câmera, longas sequências com imagens fora de foco, bela fotografia, três grandes atrizes, um grande ator e uma narração digna dos filmes da Nouvelle Vague (mas que só aparece umas poucas vezes no filme para pontuar momentos importantes da vida de Marc) são os ingredientes principais desse thriller.

O papel de Catherine Deneuve é interessante e importante, mesmo que com poucas falas. Ela é aquela figura de mulher sábia e experiente, que não precisa de muito para tudo compreender. Uma mãe super presente na vida das filhas, que respeita seus espaços até onde acha que deve. Interessante vê-la fazendo o papel de mãe de sua própria filha na vida real. Impossível não ficar tentando achar semelhanças entre as duas mulheres, apesar de concordar com muitos que dizem que Chiara parece mais com seu pai, Marcello Mastroianni.

Com estreia prevista no Brasil para outubro no Festival Internacional do Rio de Janeiro, 3 Coeurs é um filme interessante, envolvente e que mexe com nossos corações.

Um filme PRA SE DISTRAIR.

Sin City – A Dama Fatal (2014)

•setembro 21, 2014 • Leave a Comment

Título original: Sin City 2 – A Dame to Kill for Sin-City-A-Dame-to-Kill-For-Banner

Origem: EUA / Rússia

Direção: Robert Rodriguez e Frank Miller

Roteiro: Frank Miller

Com: Mickey Rourke, Bruce Willis, Jessica Alba, Eva Green, Rosario Dawson, Josh Broslin

Mistura bem sucedida de film noir com história em quadrinhos (comics), Sin City – A Dama Fatal não deslumbra por sua estética inovadora, como fez o primeiro episódio, Sin City – A Cidade do Pecado, lançado em 2005, mas consegue manter a qualidade do primeiro, desta vez ajudado por um enredo mais claro e pela presença de uma nova personagem que encanta pela beleza e pela maldade.

Transposta diretamente dos quadrinhos de Frank Miller para o cinema (ele assina o roteiro e co-dirige o filme), a história se passa na cidade fictícia de Basin City (apelidada, não sem razão, de Sin City), terra de polícia covarde e políticos corruptos (qualquer semelhança é mera coincidência!), local em que são as prostitutas, todas absolutamente lindas e sensuais, que asseguram a paz e a ordem.

Nela vivem Marv (Mickey Rourke), um brutamontes que faz justiça à sua própria maneira, seguindo suas próprias “leis” e derramando muito sangue; as gêmeas Goldie e Wendy (Jaime King), responsáveis por revelar o amor ao coração de Marv; o fantasma do detetive John Hartigan (Bruce Willis), um dos poucos personagens que parece seguir à lei que conhecemos por aqui, no mundo real; Nancy Callahan (Jessica Alba), menina que foi salva das mãos do pedófilo Roark Jr (Nick Stahl), filho do senador Roark (Powers Boothe), por John e que se torna uma prostituta obcecada por vingança e apaixonada por seu salvador; Gail (Rosario Dawson), a líder das prostitutas; Ava (Eva Green), ex-amante e grande amor do fotógrafo Dwight McCarthy (Josh Brolin), uma espécie de sereia, feiticeira, manipuladora e maquiavélica, com seu ar inocente, grande beleza e sensualidade; fora uma porção de outros personagens esdrúxulos e violentos que completam a trama complexa deste segundo filme, baseado na história A Dama Fatal e mais três outras histórias.

Totalmente digital e mantendo o bonito preto e branco do primeiro episódio – com apenas algumas imagens em cores (vermelho, azul, laranja ou verde) – a saga Sin City continua esbanjando erotismo e chamando atenção por sua estética que mistura tão bem a ilustração (animação) ao film noir, com suas silhuetas e sombras, com seus detetives, policiais e criminosos cheios de charme, suas mulheres fortes, lindas e manipuladoras. Mas se a ideia era agregar qualidade ao fazer uso da 3D, acho que o resultado não foi exatamente alcançado, já que Sin City – A Dama Fatal não é em nada superior ao primeiro (esteticamente falando). Ao contrário. Aquela sensação de “wow”, de se estar assistindo a algo nunca antes visto no cinema, já não existe mais. Talvez algo de natural para um sequel. Mas os toques de expressionismo alemão que muito me encantaram no primeiro – as sombras agigantadas projetadas na parede, os cenários que parecem pinturas, etc. -, praticamente desapareceram neste segundo episódio. Uma pena!

Por outro lado, não se pode dizer tampouco que Sin City 2 decepcione, principalmente se não se viu o primeiro, já que a mistura de film noir com os quadrinhos continua lá, agora com a profundidade extra obtida pela 3D e com uma trilha que me pareceu ainda mais bem sucedida. Sem falar na trama em si, que é um pouco mais clara, melhor conectada, o que faz o enredo ficar mais agradável, apesar do excesso de sangue (branco, muitas vezes) derramado e de tiros disparados.

Recomendo Sin City – A Dama Fatal (assim como o prévio Sin City – A Cidade do Pecado) a todos os cinéfilos de plantão, mesmo àqueles que não apreciam os filmes de ação, nem os policiais, cheios de sangue e violência. Ainda assim vale pelo deslumbramento estético que se pode experimentar!

Um filme PRA SE DISTRAIR.

 

 

 

 

 

 

Les Combattants (2014)

•setembro 9, 2014 • Leave a Comment

les combattants afiche

Título original: Les Combattants

Origem: França

Direção: Thomas Cailley

Roteiro: Thomas Cailley, Claude Le Pape

Com: Adèle Haenel, Kevin Azaïs, Antoine Laurent, Brigitte Roüan

Primeiro longa-metragem do francês Thomas Cailley, Les Combattants, apresentado em Cannes neste ano, conquistou o coração dos críticos do festival e o meu também.

Um filme jovem, ensolarado, inteligente, ecológico (sem ser ecochato), original, romântico, cheio de energia e de bom humor.

Uma história sobre jovens, saídos há pouco da adolescência, e que se vêem diante de um futuro incerto e apocalíptico. Arnaud (Kévin Azaïs) acaba de perder o pai e sente-se praticamente obrigado a ir trabalhar na empresa da família, uma pequena marcenaria em que trabalham também sua mãe e irmão. Madeleine (Adèle Haenel), de família mais abastada, interrompeu seu mestrado em Economia e tem ideia fixa de entrar no Exército para aprender a lutar. Ela se prepara diariamente para combater o apocalipse: Nada com peso nas costas, corre vários quilômetros, come peixe cru batido no liquidificador, se alimenta basicamente de proteínas.

Os destinos dos dois vão, então, se cruzar em uma tarde ensolarada, quando os amigos de Arnaud o inscrevem – sem que ele saiba – em um curso de defesa pessoal, e ele é obrigado a enfrentar Madeleine ali na beira da praia. Essa cena – bem divertida, por sinal – dá o tom do filme.

Madeleine é forte, corajosa, teimosa, determinada e corre atrás de seu objetivo. Arnaud é sensível, pequeno, aparentemente mais frágil e não sabe bem o que quer da vida.

Com roteiro bem escrito e bom ritmo, o filme é estruturado em três partes:

Na primeira, somos apresentados aos personagens, às suas personalidades e às suas diferenças. Cada um em sua casa, com suas famílias e seus mundos. Vamos, então, acompanhando, pouco a pouco, a atração que vai surgindo entre eles e aproximando seus mundos.

Num segundo momento, Madeleine e Arnaud dividem o mesmo ambiente, os dois já em treinamento no Exército. Ela, decepcionada com a artificialidade daquele universo que, ao invés de comidas cruas, natações em águas revoltas, etc., dão-lhe barrinhas de cereais durante os treinos, batatas-fritas, hot-dog, madeleines industrializadas de almoço, além de camas boas para dormir (no caso das mulheres). Arnaud, por outro lado, vai revelando sua força, mostrando que não é só um físico malhado que vence a guerra da vida. E nós, espectadores, vamos sendo, então, confrontados às verdadeiras fortalezas e fraquezas dos dois personagens.

Na terceira e última parte, o filme ganha um tom mais apocalíptico, de verdadeira luta pela sobrevivência. E é nesse ambiente que o amor floresce.

Durante todo o tempo, Les Combattants joga com a ironia e com a inversão dos papéis do homem e da mulher, mas sem nunca cair no estereótipo, no caricato. Tudo é bem equilibrado neste filme, desde a mise en scène até a excelente trilha, passando, obviamente pelo humor. Um humor refinado, elegante, inteligente, que critica o desperdício, o desmatamento, os alimentos processados, o consumo excessivo, a pressão para se definir “um” caminho, tudo sem se deixar cair na armadilha do discurso ortodoxo chato.

Les Combattants é, por fim, um filme gostoso de assistir. Ele nos leva de volta ao início da nossa vida de adulto, em que o futuro é ainda uma enorme página em branco, que precisa começar a ser escrita. Que rumo tomar? Para onde ir? Contra quem ou por que causas lutar?

Um filme de combate, de sobrevivência, que faz pensar nas palavras do poeta Gonçalves Dias:

Não chores, meu filho;

Não chores, que a vida

É luta renhida:

Viver é lutar.

A vida é combate,

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos

Só pode exaltar.

Parabéns a Thomas Cailley por este primeiro longa. Que venham outros!

Um filme PRA SE DISTRAIR e PRA PENSAR.

 

 

Vida de Cinema

•setembro 1, 2014 • Leave a Comment

Para os cinéfilos de plantão, uma boa dica de leitura é a autobiografia recém-publicada de Cacá Diegues.  IMG_4052

Apesar de suas seiscentas e muitas páginas, o livro é super fácil e gostoso de ler, apresentando-nos os bastidores da história do cinema brasileiro, com ênfase no período do Cinema Novo, movimento do qual Cacá Diegues foi um dos fundadores.

O livro faz também um excelente apanhado da evolução política de nosso País, fazendo-nos viajar para dentro de um dos períodos mais complicados de nossa história, o da ditadura militar, e depois rumo à democratização e à abertura.

Vida de Cinema é uma prazerosa viagem no tempo, daquelas capazes de transportar-nos para bem próximo de grandes personalidades da cultura brasileira, como Nara Leão, primeira esposa de Cacá e uma das musas da Bossa Nova, fora Chico Buarque, Glauber Rocha – de quem o cineasta era grande amigo -, Arnaldo Jabor e muitos outros. Sem falar nas personalidades do cinema internacional com quem Cacá teve o privilégio de trabalhar ou a honra de conhecer. Entre essas estão Jeanne Moreau (que atuou em seu filme Joanna Francesa, de 1973) ou Rita Hayworth (de quem recebeu um simpático bilhetinho, até hoje pendurado na parede de seu escritório).

Sem dúvida, uma excelente leitura para os apaixonados por cinema ou pela história brasileira tout court.

Veja aqui Nara Leão cantando a música do filme Joanna Francesa.

Vida de Cinema – Antes, durante e depois do Cinema Novo

Autor: Cacá Diegues

Editora Objetiva

678 páginas

 

 
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