Malcolm & Marie (2021)
Origem: EUA
Direção: Sam Levinson
Roteiro: Sam Levinson
Elenco: Zandaya e John David Washington
Um filme em preto e branco, dois atores, um único cenário, uma única noite… pode ser bom? A resposta é sim, desde que você seja do tipo que gosta de filmes com pouca ação e muitos diálogos, claro!
Com mais jeito de cinema europeu do que americano, Malcolm & Marie é uma DR* sem fim, onde não há vilões nem vítimas. Ou melhor, ambos são vilões e vítimas, já que é assim que funciona qualquer relação conjugal. Quem tem razão, quem não tem? Isso é o que nos perguntamos o tempo todo no filme, sem nunca chegarmos a uma conclusão. Horas pensamos que Marie tem razão, horas achamos que ela está delirando e que Malcolm é que está sendo sensato… Uma espécie de gangorra de sentimentos, que se refletem no próprio ritmo do filme, que tem seus altos e baixos.
A história começa com uma casa vazia e um carro chegando ao longe. Descobrimos em seguida que seus moradores estavam no lançamento do filme do protagonista, Malcolm, um cineasta interpretado por John David Washington, o filho de Denzel. Com ele, chega sua companheira Marie, uma jovem atriz, ex-viciada, brilhantemente interpretada por Zandaya, nova queridinha de Hollywood.
O filme, dirigido e roteirizado por Sam Levinson – o mesmo da série Euphoria, da HBO, estrelado pela própria Zendaya – é uma queda de braços em que não há vencedor. Filmado quase em segredo durante a pandemia, respeitando todos os protocolos de segurança, o roteiro acaba refletindo o clima de confinamento que o mundo tem vivido nesses últimos meses, em que casais dispõem de tempo de sobra para discutir a relação… Chantagem, autossabotagem, vitimização, traições, verdades, vaidades, vícios, amor, raiva, tudo está aqui em discussão.
A fotografia de Malcolm & Mary, em preto e branco, é linda, linda! E apesar do elenco diminuto, a casa parece cheia, fruto da movimentação coreografada dos personagens e da agilidade da câmera e de seus volteios por vários cômodos. Uma casa que, aliás, tem papel protagonístico, sendo praticamente um terceiro personagem dessa história, tão grande é sua presença na tela. Ela divide espaços e cenas, decora, dá ritmo, expõe, esconde e acaba criando um jogo de interior/exterior que pode muito bem ser entendido como uma alusão ao que escolhemos deixar ou não deixar transparecer de nossas almas.
O filme toca ainda em outro ponto deveras interessante, que é a questão da crítica cinematográfica. Sam Levinson é duro em sua maneira de retratar a crítica atual! Ele alega, pela voz de Malcolm, que hoje só tem valor aquele filme que tem uma causa, um discurso, uma questão política envolvida. Os críticos acabam por enxergar coisas que nem mesmo existem, em função de quem está por trás da câmera. Homem hetero branco? Mulher negra? Latina? Homossexual? Enfim, uma discussão super válida, já que na corrida dos festivais, o que temos visto é uma tendência a filmes ativistas sairem com as maiores premiações. O que obviamente não é ruim, já que defender causas é de fato uma das funções do cinema, que cada vez mais se consagra como um eficaz espaço de denúncias. Mas a sétima arte é também diversão, lazer, entretenimento. E nada impede que um filme assim seja também um ótimo filme! As polarizações e políticas de cancelamento atingiram a indústria cinematográfica, que se vê hoje engessada, pautada, amarrando a criatividade de muita gente!
Malcolm & Marie talvez não seja um filme que agrade a todos os públicos, já que está mais para um filme-divã ou para uma peça de teatro que explora (muito bem) os aparatos técnicos do cinema. Mas se você é do tipo que gosta de encarar um bom diálogo, uma boa atuação e gosta de histórias que misturam romance e drama, eu super recomendo!
UM FILME PRA PENSAR
*DR – discutindo a relação