Ferrugem e Ossos (2012)
Título original: De Rouille et d’Os
Origem: França / Bélgica
Diretor: Jacques Audiard
Roteiro: Jacques Audiard, Thomas Bidegain
Com: Marion Cotillard, Matthias Schoenaerts, Armand Verdure, Corrine Masiero
Um filme com tudo para ser um dramalhão piegas, meloso, e mil-vezes visto, mas que, ao contrário, é de um realismo, de uma simplicidade e de uma grandeza estonteantes!
Em competição pela Palma de Ouro no Festival de Cannes deste ano, De Rouille et d’Os conta as histórias de Ali (Matthias Schoenaerts) e de Stéphanie (Marion Cotillard) e de como seus destinos se cruzam e se emendam. O roteiro é baseado no livro de Craig Davison e traz para o cinema alguns de seus personagens.
Ali é um homem imenso, forte, simples, rude, um ex-lutador de boxe desempregado, que se vê de repente responsável por um filho de 5 anos (Armand Verdure) com quem ele nunca teve contato. Os dois saem da Bélgica rumo ao sul da França, em busca de um abrigo na casa de Anna (Corrine Masiero), irmã de Ali. Sem dinheiro, a dupla segue pegando carona e comendo as sobras de comidas deixadas pelos mais afortunados.
Stéphanie é uma moça mignon, de aparência frágil, sem filhos e que exerce uma profissão incomum: ela é adestradora de orcas em um parque aquático em Antibes na Côte d’Azur, França. Lá ela mora com um companheiro e leva uma vida estável de classe média francesa.
Chegando ao sul da França, o destino de Ali começa a mudar. Logo ele arruma um emprego de segurança em uma boate e é lá que ele conhece Stéphanie, em uma noite em que ela se envolve em uma briga, leva um golpe no nariz e é ele quem a ajuda, levando-a para casa. Eles trocam telefones e Ali vai embora.
Nos dias que se seguem, Stéphanie sofre um acidente de trabalho. Enquanto faz uma de suas costumeiras apresentações no Mariland, ela é atacada por uma de suas orcas “adestradas” e tem suas pernas amputadas. O drama – jamais extrapolado – tem então início.
Depois de alguns meses “de luto”, Stéphanie decide ligar para Ali. Eles começam uma relação original de amizade, prática, meio fria, meio estranha, sincera, sem melindres ou, usando a linguagem do próprio personagem, simplesmente “operacional”. Ali, em sua natural frieza e “falta de modos”, trata Stéphanie sem pena, sem constrangimento, sem vergonha, sem censura. Ele não vê na amputação de suas pernas nenhum motivo para que ela deixe de fazer as coisas, nem para que ela tenha pena dela mesma. Trata-se apenas de um fato, de uma circunstância e de uma realidade. E é aí que está a beleza do filme!
Stéphanie, por sua vez, não julga Ali por sua condição de brutamontes-lutador-sem-instruções, pai desatento de um filho de mãe desconhecida. Pra ela nada disso parece importar. Eles vivem suas vidas e sua relação sem se preocupar com ninguém nem com nada, numa espécie de bolha paradoxal ao realismo que domina o filme.
Jacques Audiard não se preocupa nem em nos contar o passado dos personagens. No seu roteiro, recheado de elipses, não importa muito de onde eles vêm, o que já fizeram, quem foram… o que conta é o agora, é o que eles são hoje e o que podem fazer a partir de então.
Quanto à estética do filme, talvez fosse justo dizer que Audiard optou pela não-beleza ou, pelo menos, pela não-exploração da beleza estética. Não que o filme seja feio. Ao contrário! Mas não há, por exemplo, grandes planos de mar azul, nem de sol brilhando, nem de praias lindas com gente bonita passeando, como se espera de um filme rodado no sul da França. Tudo é bem mais simples e natural do que isso. Certamente, há o mar, há o sol, e há até mesmo o azul, mas não em seu esplendor. O que predomina são os dias comuns, às vezes nublados, a pobreza, as casas feias, as cores pálidas. Nada de glamour. A própria Marion Cotillard está sempre de cara lavada e cabelo lambido, com sua falta-de-pernas à mostra…
Na verdade, a beleza maior do filme é justamente a de tratar tudo com simplicidade, sem “maquiagem”, sem artifícios, sem excessos, sem melindres. A vida é como ela é, do jeito que ela pode ser, sem tempo para grandes reflexões nem julgamentos de valores. E a grande estrela aqui é o corpo, explorado por magníficos close-ups e câmeras lentas. O corpo é o centro de tudo. Seja ele forte, franzino, flexível, machucado, saudável, amputado, corpo de gente, de animal, de homem, de mulher, de baleia. Corpos diversos que cumprem seu papel de roupa da alma, ou de fantasias para o que somos de verdade.
De Rouille et D’Os é um filme PRA PENSAR.
Liloca, agora o filme já tem nome no Brasil. Ferrugem e ossos. É maravilhoso mesmo. Incrível como tanta dor pode transformar a vida das pessoas em algo belo. Imperdível.
ana said this on maio 17, 2013 at 14:02 |
Ana, já mudei o título do filme aqui no blog! Obrigada. Que bom que vc gostou!
Lilia Lustosa said this on maio 18, 2013 at 11:13 |
Oi Lilia,
Aqui em SP, o filme ficou só em cartaz durante o Festival Varilux de Cinema Francês (até ontem). Ele não entrou em cartaz no circuito comercial … 🙁
Andréa Assis said this on maio 18, 2013 at 00:24 |
Que pena, Andréa! Será que você não consegue ver pela Apple TV? Tenho quase certeza de que aqui na Europa já está disponível em DVD. Se você quiser, posso procurar e levar quando formos ao Brasil!
Lilia Lustosa said this on maio 18, 2013 at 11:14 |
Td bem Lilia. Aguardo chegar nas locadoras. Já aprendi a ter paciência com esses tipos de filmes… ;). De qq forma, obrigada.
Andréa Assis said this on maio 19, 2013 at 16:55 |